Páginas 157 e 158 (trechos selecionados):
O “saber” e o “ser” já foram bens de alto valor moral social. Hoje vivemos os tempos do “ter”, em que não importa o que uma pessoa saiba ou faça, mas sim que ela tenha dinheiro (de preferência muito) para pagar por sua ignorância e por suas falhas de caráter. Nesse cenário propício surge a cultura da “esperteza”: temos que ser ricos, bonitos, etiquetados, sarados, descolados e muito invejados. O pior dessa cultura é que seus membros sociais não se contentam apenas com o “ter”, é necessário exibir e ostentar todos os seus bens. Assim ninguém esquece, nem sequer por um minuto, quem são os donos da festa.
Páginas 190 a 192 (trechos selecionados):
A ideologia sobre a qual se alicerça a cultura dos nossos tempos é baseada em três princípios básicos: (1) o individualismo; (2) o relativismo; (3) o instrumentalismo.
De forma compreensível e sem, contudo, aprofundar-me na esfera da filosofia, os três princípios podem ser avaliados da seguinte maneira:
1. O individualismo prega a busca do melhor tipo de vida a se usufruir. Entende-se como o melhor tipo de vida aquele que abrange o autodesenvolvimento, a autorrealização e a autossatisfação. De acordo com essa concepção, o indivíduo tem a “obrigação moral” de buscar sua felicidade em detrimento de qualquer outra obrigação com os demais.
2. Segundo o relativismo, todas as escolhas são igualmente importantes, pois não há um padrão de valor objetivo que nos permita estabelecer uma hierarquia de condutas. Assim, qualquer ação que leva o indivíduo a atingir a autossatisfação é válida e não pode ser questionada.
3. O instrumentalismo afirma que o valor de qualquer coisa fora de nós é apenas um valor instrumental, ou seja, o valor das pessoas e das coisas se resume no que elas podem fazer por nós.
Na verdade, tudo está implícito no primeiro e principal componente da cultura moderna: o individualismo. Assim, nosso principal objetivo é a realização e a satisfação pessoais.
Estamos perdendo o senso de responsabilidade compartilhada no campo social e o de vinculação significativa nas relações interpessoais. O aumento implacável da violência é senão uma resposta lógica e previsível a toda essa situação.
Páginas 193 e 194 (trechos selecionados):
Somente uma educação pautada em sólidos valores altruístas poderá fazer surgir uma nova ética social que seja capaz de conciliar direitos individuais com responsabilidades interpessoais e coletivas. A aprendizagem altruísta é o único caminho possível para combatermos a cultura psicopática pautada na insensibilidade interpessoal e na ausência da solidariedade coletiva.
A construção de uma sociedade mais solidária é, a meu ver, o grande desafio dos nossos tempos. E para tal empreitada teremos que harmonizar o desenvolvimento tecnológico com uma consciência que não faça qualquer tipo de concessão ao estilo psicopático de ser ou de viver. A luta contra a psicopatia é a luta pelo que há de mais humano em cada um de nós. É a luta por um mundo mais ético e menos violento, repleto de “gente fina, elegante e sincera”.
Autor: Ana Beatriz Barbosa Silva (psiquiatra no Rio de Janeiro)
Editora: Objetiva (RJ)
Ano de publicação: 2008 (1ª edição)
Fonte: Criacionismo
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